Todos os homens podem, e devem, em qualquer
circunstância, considerar que a vida é bela e viver de acordo com isso. Ninguém
tem motivos para a considerar desprovida de nobreza e grandiosidade. A dor e as
contrariedades sempre fizeram parte da vida dos homens, e nem por isso eles
deixaram de a amar.
Mas acontece que nesta vida se sofre realmente, e que –
ao contrário do que antigamente sucedia – aqueles que sofrem são agora muitas
vezes abandonados pelos outros, e têm de viver sozinhos com a sua dor. À qual se
acrescenta, então, a dor enorme da solidão.
Sempre houve doentes e anciãos, mas antigamente eram
considerados um tesouro. Agora não passam de um estorvo… E é só por isso que
hoje se fala em eutanásia, quando no passado havia apenas o suicídio: o suicídio
é uma decisão pessoal; a eutanásia acabará por ser uma imposição da sociedade.
Há em muitas cabeças uma noção da vida que é
chocantemente pobre, desagradavelmente rasteira, tristemente vazia. Consiste em
olhar para a vida de uma forma utilitária, com base numa concepção egoísta e em
critérios apenas econômicos: se uma vida não é útil – se não é produtiva, se
não proporciona todo o prazer – então não tem razão de ser. Pode eliminar-se,
como se elimina um automóvel velho ou sem conserto, um par de sapatos rotos,
uma camisola demasiadas vezes remendada.
E nem sequer é nas pessoas muito doentes, ou nos idosos
que estão perto da morte, que essa mentalidade é frequente. Não. É nos outros,
nos que estão convencidos de que ainda vão ficar aqui muito tempo e se acham no
direito de construir uma sociedade com regras que lhes parecem mais perfeitas
do que as da natureza, livres de quaisquer critérios e valores que não sejam os
econômicos e os do bem estar.
A grande questão da eutanásia não consiste em se cada
pessoa pode, ou não, ter a liberdade de escolher o seu destino. E também não
reside em se uma pessoa pode pedir a outra que a mate.
É ainda pior do que isso: a questão está em que o triunfo
desta visão utilitária da vida levaria – como, de resto, já está a suceder na
Holanda – à eliminação de pessoas que, não querendo elas mesmas acabar com a
vida, são consideradas inúteis por uma sociedade que se tornou materialista (a
decisão é transferida para os médicos e para os familiares, e para os
parlamentos, que muitas vezes estão ansiosos por se verem livres de um fardo).
Assim é que desaparece realmente a liberdade de escolher
o próprio destino, e as pessoas se tornam em objetos à mercê dos interesses
econômicos e dos falsos critérios de utilidade social.
É muito fácil aproveitar-se da extrema debilidade –
física e emocional – de um doente terminal. Até para o convencer das
presumíveis vantagens de uma “morte doce”. Muito mais fácil do que
proporcionar-lhe todo o apoio e carinho de que necessita para levar a vida até
ao fim – sem desistir – e morrer com verdadeira dignidade.
A dor é também uma falsa questão. A medicina sabe tirar a
dor, e o resto… aguenta-se. O pior é a solidão e o abandono. Isso é que é
difícil de suportar. E tem uma solução bem simples… Bastaria que todos os que
estão à volta do doente olhassem para aquela vida – para a vida – sem egoísmo.
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