Senso Crítico

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segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Sobre os Laços Humanos

Pintura de Donald Zolan



Um viciado em facebook me segredou, ou melhor, não segredou de fato, mas gabou-de que havia feito 500 amigos em um dia. Minha resposta foi que eu tenho 86 anos, mas não tenho 500 amigos. Eu não consegui isto. Então, quando ele diz “amigo” e eu digo “amigo”, não queremos dizer a mesma coisa. São coisas diferentes. Quando eu era jovem eu nunca tive o conceito de redes, eu tinha o conceito de laços humanos, de comunidades, este tipo de coisas, mas não redes. Qual é a diferença entre comunidade e rede? A comunidade precede você. Você nasce em uma comum idade. Por outro lado temos a rede. O que é uma rede? Ao contrário da comunidade, a rede é feita e mantida viva por duas atividades diferentes: uma é conectar e a outra é desconectar. E eu acho que a atratividade do novo tipo de amizade, o tipo de amizade do facebook, como eu a chamo, esta exatamente aí. A facilidade em desconectar. É fácil conectar, fazer amigos, mas o maior atrativo é a facilidade de desconectar.

Imagine que o que você tem não são amigos online. Conexões online, compartilhamento online, mas conexões off-line, conexões de verdade, frente-a-frente, corpo-a-corpo, olho no olho. Então, romper relações é um evento muito traumático. Você tem que encontrar desculpas, você tem que explicar, você tem que mentir com frequência e, mesmo assim, você não se sente seguro, porque seu parceiro diz que você não tem direitos, que você é um porco, etc. É difícil, mas na internet é tão fácil, você só pressiona delete e pronto! Ao invés de 500 amigos você terá 499, mas isto será apenas temporário, porque amanhã você terá outros 500. E isto mina os laços humanos.

Os laços humanos são uma mistura de bênção e maldição.

Benção, porque é realmente muito prazeroso, muito satisfatório, ter outro parceiro com quem contar, e fazer algo por ele ou ela. É um tipo de experiência indisponível para a amizade no facebook. Então, é uma bênção, e eu acho que muitos jovens não tem nem mesmo consciência do que eles realmente perderam, porque eles nunca vivenciaram este tipo de situação.

Por outro lado há a maldição, pois quando você entra no laço, você espera ficar lá para sempre. Você jura. Você faz um juramento: até que a morte nos separe; para sempre. O que isto significa? Significa que você empenha seu futuro. Talvez amanhã, ou mês que vem, hajam novas oportunidades. Agora você não consegue prevê-las, e você não será capaz de pegar estas oportunidades, porque você ficará preso aos seus antigos compromissos, as suas antigas obrigações. Então, é uma situação ambivalente. E consequentemente um fenômeno curioso desta pessoa solitária numa multidão de solitários. Estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo. Há dois valores essenciais que são absolutamente indispensáveis para uma vida satisfatória, recompensadora e relativamente feliz. Um é a segurança e o outro é a liberdade. Você não consegue ser feliz ou ter uma vida digna na ausência de um deles, certo? Segurança sem liberdade é escravidão. Liberdade sem segurança é um completo caos, incapacidade de planejar nada, fazer nada, nem mesmo sonhar com isto. Então você precisa dos dois. O problema é que na história ninguém ainda encontrou a fórmula dourada, a mistura perfeita de segurança e liberdade. Cada vez que você tem mais de segurança você entrega um pouco de sua liberdade. Não há outra maneira. Cada vez que você tem mais liberdade, você entrega um pouco de sua segurança. Você sempre ganha algo e perde algo também.

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